quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Consequências do Pecado - Parte 1/2

Ilustrando a forma binária de enxergar a vida, se alguém não estiver certo, estará errado e será punido...

Digressões digestivas...

O sentimento de unicidade pode ser o mesmo que inspira as mais importantes religiões, pelo menos as que tem maior número de adeptos no ocidente. Mas... O problema é o "uso" desse sentimento de unicidade. Eu, você, nós que já não seguimos fé religiosa alguma, podemos até sentir o que seja esse estar conectado a tudo pela nossa própria origem atômica-molecular e não impomos a necessidade de sermos "bons" ou de estarmos agindo corretamente para alcançarmos esse estado de conexão. Ele simplesmente acontece e independe de crermos nele. Já para o religioso monoteísta, existe a necessidade de estar em "sintonia" com o que se imagina ser o "bem" a fim de que Deus(ou "aquilo que empresta existência ao universo") possa se manifestar na vida desse alguém. Senão, o "mal" é o que se manifesta... e toda sorte de "erro", perversão, corrupção, má formação, defeitos, acontece.

As implicações disso são a constante vigilância dos próprios atos visando manter a tal da sintonia. E a vigilância constante dos atos alheios a fim de que não desviem do "bom caminho". Bem resumidamente, é isso que torna o seguidor de monoteísmos fundamentados na dualidade "bem/mal" tão predisposto ao fanatismo: O controle do fiofó alheio a fim do sujeito próprio não cair na tentação. O fanatismo e tudo que nele implica nasce de controlar e olhar o rabo alheio antes de olhar o próprio rabo. Nasce de exigir do outro o comportamento exemplar, antes de exigir tal comportamento de si mesmo.

Exemplificando a importância do "bom caminhar", a origem de termos como "pecado" vem de percorrer mal o caminho, de estar manco, de não estar de acordo com o que se espera do "bom caminhante". E o caminho nada mais é do que a própria existência e tudo que nela se manifestar, quer em conformidade com o que se imagina ser Deus=bem absoluto, perfeição absoluta, quer em não conformidade com isso na forma de toda sorte de erros, defeitos, má formação. Daí a segregação de tudo que não seja harmônico, belo, simétrico, criado com uma finalidade X, ou Y e do que se possa esperar X ou Y atitudes, desejos, aspirações, etc. A idéia do "propósito divino" para cada um nasce daí. De estar ou não em "sintonia" com Deus e isso manifestar-se na própria existência de quem de qualquer forma existe, ou não estaria aqui se manifestando.

Percebe as implicações disso? No final, o que se tem é uma das formas mais abjetas de controle das massas jamais cogitada. Você tira de cada um a possibilidade de manifestar-se livremente e obter resultados imprevisíveis, mesmo que ainda totalmente sujeitos à aplicação de leis físicas e oferece a cada um a chance de pretender controlar o destino(onde se pretende chegar...) a partir da opção de escolha entre fazer o "bem" e estar em "sintonia" com Deus e com isso percorrer bem o caminho, ou escolher fazer o "mal" e arcar com as consequências de tal atitude "manca". Deus continua onde sempre esteve... o ser humano é que se torna incapaz de percebê-lo ao condicionar a si mesmo a necessidade de buscá-lo. E com isso, torna-se sujeito a que o lembrem a todo momento da necessidade de manter a sintonia... O poder e a consciência de que na realidade se é o próprio universo, que se está conectado a tudo e todos através da unicidade manifesta pela própria existência, é relegado a último plano e é assim que o "filho de deus" torna-se súdito ao invés de abraçar para si a condição de majestade. Existe a partir daí a necessidade de uma fé cega e burra ao invés do sentimento de conexão de tudo com tudo e os espertalhões aproveitam-se disso impondo que a pretensa sintonia subjugada aos desmandos dos representantes divinos é o que pode salvar o caminhante do pecado e alçá-lo ao seu almejado destino feliz.

Some-se a isso a incapacidade de interpretação correta das coisas, a visão distorcida, que juntas criam as religiões à imagem e semelhança de seus seguidores. Então, entendem por "bem" aquilo que eles acham que é bem. E não há meios de dizer que seja um bem absoluto. Daí todo problema relativo à não aceitação das diferenças, daquilo que eles consideram defeituoso, doente, "errado" e portanto impuro, longe da "sintonia" com Deus, ou com aquilo que eles interpretam que seja perfeição absoluta também. Daí que eu falei no "uso" logo de cara. Tudo isso sendo usado pra manipular mentes, criar dependência, impossibilitar pessoas de estabelecerem ligação com o todo, que é direta, basta estar disposto a sentir. E com isso, com a dependência estabelecida, com o poder de decisão tirado das mãos dos fiéis, manter o séquito de seguidores aptos a manterem os custos dos grupos criados ao redor dos autoproclamados "emissários" divinos. O resultado é o que se vê: religiosos controlando os outros, religiosos julgando os outros, religiosos mortos de vontade de fazer exatamente aquilo que é proibido pela forma doentia de encarar a busca pela perfeição e pelo "bem", capazes até de matarem quem faça/aja diferente deles. Intolerância, hipocrisia... tudo em nome de manter-se no caminho sem pecar.

Resumindo: Eu vejo religião como uma forma de manter pessoas unidas em grandes grupos sem que se matem. Políticos na figura de reis, imperadores, já sacaram isso muito antes de existirem religiões ocidentais, ou não teríamos tantos monumentos da antiguidade feitos por milhares de pessoas focadas em agradar seu deus personificado na figura do regente. E cada uma tem suas regras, a depender das pessoas envolvidas.

Eu não sou a favor de combater religiões por uma questão de coerência. O senso de culto ao centro nasce espontaneamente em grupos humanos. Basta ver até como os grupos ateus se comportam. De repente, se não fizer de conta que todo mundo é igual, não vai pra frente. E as regras ou leis nascem espontaneamente também. Sempre buscando criar vínculos entre os envolvidos, metas a serem alcançadas e aceitação quase inconteste do que o líder, ou líderes, disserem.

O que eu combato é a aceitação pura e simples do que é dito seja lá por quem for, sem questionamento, sem entender o que está movendo a roda. E o medo de não ser aceito, caso não aceite, nem se dance conforme a música que estiver tocando. Isso porque, em algumas pessoas, isso tem o efeito de criar condições para o fanatismo (seguir regras sem questionar), o fundamentalismo (ditar regras e impô-las sem levar em conta a vontade dos demais). Daí, meu combate é ao espírito de rebanho, pensamento de grupo, comportamento de manada. Coisa que religiões centradas no indivíduo, ou naquilo que ele tem que desenvolver por si mesmo apenas e tão somente, não incentiva, nem estimula, muito pelo contrário. O budismo é assim. O ocultismo também, bem como todo esoterismo(não falando no eXoterismo, que é outra coisa... ), prática de artes marciais, enfim, todas as práticas que exigem do praticante uma disciplina e um desenvolvimento pessoal e intransferível, fazendo com que não adiante olhar o rabo do outro pra ver se está sujo ou não, porque o que importa é cuidar do próprio rabo.

O alvo das inquietações, portanto, são as religiões fundamentadas na aparência, no volume de adeptos, do desejo de manter todos juntos sem questionamento, o que estimula o nivelamento bem por baixo a fim de não criar mal estar pelas diferenças de opiniões... e as consequências são as que a gente sai batendo por aí adoidado, na forma de absurdos e imbecilidades sendo levadas a sério.